Sim, já começo a provocação no título, como se fosse um grito no meio da multidão. Daqueles entoados com paixão, com indignação e força para provocar mudanças. Precisamos desses momentos às vezes, não é? Colocar tudo para fora e reorganizar as coisas aqui dentro. Me sinto assim depois de vivenciar dias super intensos no ELLA – Encontro Latino Americano Feminista, na cidade de La Plata (Argentina). Emerge em mim uma nova mulher.
Silenciamento ou falta de conhecimento?
Não pretendo com este texto criticar o feminismo, contudo preciso fazer esta provocação para conseguirmos avançar dentro do movimento. Além disso, preciso compartilhar minha experiência com o Ella, pois tenho a sensação de ter vivido um mês naquele lugar.
É lindo estar em um ambiente com mulheres empoderadas, independentes e abertas ao aprendizado. Ouvi histórias lindas de superação pessoal, conquistas antes consideradas impossíveis para algumas. A liberdade de se expor foi única. Notei também a reação de muitas quando relatava as dificuldades que nós experimentamos por causa do capacitismo e machismo.
Já esperava desconhecimento sobre a deficiência em si, como lidar ou perceber a falta de acessibilidade nos espaços. Sabia também que muitas delas sequer imaginavam o que é ser uma mulher com deficiência, afinal minha “função” ali era trazer esse relato para o debate. Contudo, não deixa de ser incômodo de certa maneira.
Sim, sei que ninguém nasce sabendo. Também sei da ausência de conhecimento e tudo mais. Porém nada disso deixa de ser desagradável às vezes.
Ali, fui ouvida, mas e aqui fora? Muitas vezes vejo sites, blogs e páginas limitando as ações do feminismo às negras, gordas, trans, lésbicas e nada sobre nós.
Somos mulheres. Temos desejos, anseios, medos, inseguranças, sofremos opressão tanto quanto as outras, somos limitadas pela falta de acessibilidade e somos castradas socialmente, uma vez que desconsideram nossa capacidade de construir relações afetivas.
Há um grito contido, silenciado e ignorado por muitas. Há mulheres vivendo sem saber o que é ser mulher. Não se vêem como tal, portanto não entendem como o feminismo seria bom para a vida delas. Aliás, não se vêem no feminismo. Muitas ainda precisam de um apoio para se erguer.
Aprendi no Ella que os machistas, racistas e capacitistas não passarão. Vi a força e potência da mulher, fui recebida e ouvida com carinho e empatia. Creio que vivi o feminismo de um modo muito bonito.
Por isso digo: não admito um movimento que não nos caiba. Faremos barulho, seguiremos unidas e vamos construir um feminismo real e inclusivo.
Só preciso saber de uma coisa:
Você está comigo?
* Esse texto foi publicado originalmente em 16 de dezembro de 2018 no Disbuga.