Todo mundo precisa de um pedacinho de céu. Um pedacinho de céu pode ser um abraço de filho. Pode estar na crepioca que sua mãe faz pra você ou naquele mergulho no clube em plena terça de manhã. Pode ser a ligação de uma amiga sumida há muito tempo ou algumas linhas que você rabisca pra desentalar emoções.

Um pedacinho de céu pode vir num papo de corredor com um bom colega, numa aula bem dada e na vitória de um aluno que superou dificuldades com a sua ajuda. Reside em coisas tão diversas quanto a gargalhada de um bebê, um trabalho bem executado e uma noite inesquecível. Pode estar num gole da sua bebida preferida ou num cafuné inesperado. Numa mensagem carinhosa no zap, num meme que te faz rachar de rir. Pode ser aquela canção triste que chama o choro guardado, ou uma alegre, que te faz dançar varrendo a casa.

Um pedacinho de céu pode ser uma borboleta que pousou no seu cabelo, o chamego de um pet que traz consigo companhia e espirros. E pode ser também um momento de solidão: só você com você mesmo, e mais ninguém. Pode ser uma paisagem bonita, uma brisa no calor, um banho quentinho no inverno, uma notícia boa no jornal.

Por o pé na grama é sentir um pedacinho de céu. Na areia da praia, então, é um pedação. Entrar no mar, meu Deus, é quase o céu inteiro. E se for mar de montanha, é céu também. Sentir o vento bagunçando o cabelo ou se encharcar de chuva. Cochilar na rede depois do almoço. Conhecer gente diferente e aprender coisas novas. Repetir as que você sabe que adora.

Viajar é pisar nesse pedacinho, e voltar pra casa é fazer isso com os dois pés. Almoçar domingo com a família é um céu e tanto. Escutar pessoas e ser ouvido. Comer chocolate sem culpa. Ver um pôr do sol com direito à estrela cadente. Ganhar uma música. Superar um medo. Sonhar alto. Lembrar de um passado gostoso. Beijar na boca de quem a gente ama é céu que não tem fim. Uma noite bem dormida. Um passeio de moto. Ou de bike. Ou a pé. Ler poesia. Se besuntar de creme e sentir que cuida de si. Aprender a dizer não.

Tudo isso esconde um pedacinho de céu. E há vários deles por aí, a gente é que não presta atenção.

Eu moro num apartamento com uma pequena área que me permite respirar, de vez em quando. No meio de tantos prédios em uma cidade como BH, consigo olhar pra cima e ver um pedacinho de céu. Ele não é enorme e nem sempre está azul. Mas pelo menos até que outros edifícios nasçam aqui por perto, é algo continuamente disponível – depende só de eu parar e decidir enxergá-lo.

Quando os problemas são muitos, o risco é me esquecer dele, passar reto sem perceber o que estou perdendo focada só em achar soluções. Porque é exatamente aí que esse precioso espaço se torna mais importante do que nunca. Porque olhar para aquela beiradinha de nada, escondendo um céu infinito, me confronta com a minha própria insignificância – mas de um jeito que não me agride; me aquieta. Me faz sentir que talvez eu possa tudo, embora me lembre que eu preciso de pouco. Esse cantinho limitado faz meus limites pesarem menos. Ele se multiplica em pedaços de um passado gostoso e de um futuro em aberto. Abarcando o que a vida já foi e tudo o que pode vir a ser, me faz respirar o presente mais leve.

Quando o ignoro, ele se transfigura nas pequenas grandes coisas que descrevi logo agora. E aí, no meio de um dia infernal, de repente esbarro nesses detalhes, na natureza, nas pessoas, em atitudes que me lembram que ele existe: esse santo pedacinho de céu, à disposição da gente o tempo inteiro. Tão precioso quanto negligenciado… onde cabem cansaço, sonhos, decepções, vontades… tudo o que eu quiser. Todo mundo precisa de um pedacinho de céu. Qual é o seu?

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