*Tradu\u00e7\u00e3o de Betina Ticoulat.<\/p>\r\n<\/div>\r\n\r\n\r\n\r\n
Algo diferente acontece com as meninas, a quem o sistema social e cultural hostiliza continuamente com m\u00faltiplas mensagens negativas a respeito de seus corpos e da auto-explora\u00e7\u00e3o destes. Uma destas mensagens \u00e9 sobre o sangramento menstrual, considerado historicamente como um estado de impureza, imund\u00edcie, decomposi\u00e7\u00e3o e doen\u00e7a.<\/p>\r\n\r\n\r\n\r\n
A chegada dos 7 anos, tanto para as meninas quanto para os meninos, traz consigo uma onda de mudan\u00e7as f\u00edsicas, emocionais e estruturais que requerem ser acompanhadas de uma forma especial. Entretanto, a cultura patriarcal proporcionou um lugar privilegiado para o g\u00eanero masculino e isto faz com que, habitualmente, os meninos possam transitar por esta etapa em condi\u00e7\u00f5es mais favor\u00e1veis.<\/p>\r\n\r\n\r\n\r\n
\u00c9 importante mencionar que os processos biol\u00f3gicos das mulheres t\u00eam sido tratados como doen\u00e7as desde a pr\u00f3pria medicina ocidental. A partir da\u00ed n\u00f3s, mulheres, acabamos padecendo de nossos corpos f\u00edsica, social e culturalmente.<\/p>\r\n\r\n\r\n\r\n
Cabe lembrar que os primeiros fil\u00f3sofos e estudiosos, entre eles Hip\u00f3crates e Arist\u00f3teles, em seus tratados sobre o corpo humano, examinavam o modelo de “corpo s\u00e3o e completo”: o corpo do homem, e partir disto descreveram o corpo “imperfeito e aberrante”: o corpo das mulheres.<\/strong><\/p>\r\n\r\n\r\n\r\n Em muitos territ\u00f3rios da Am\u00e9rica Latina \u00e9 comum a express\u00e3o “a menina j\u00e1 adoeceu” para se referir \u00e0 experi\u00eancia da menarca. Uma mulher, por exemplo, nos contava em uma de nossas oficinas sobre Educa\u00e7\u00e3o Menstrual, que quando chegou sua primeira menstrua\u00e7\u00e3o, sua m\u00e3e lhe disse: “bem-vinda ao mart\u00edrio mensal”. Somado a isso est\u00e3o os comerciais de televis\u00e3o, que o tempo todo vendem seguran\u00e7a por meio dos absorventes higi\u00eanicos descart\u00e1veis, alimentando a cren\u00e7a de que este processo biol\u00f3gico as faz vulner\u00e1veis e portanto inseguras.<\/p>\r\n\r\n\r\n\r\n A escola n\u00e3o representa um lugar protetor ou c\u00f4modo para experimentar a primeira menstrua\u00e7\u00e3o ou um acidente com o sangramento. Habitualmente \u00e9 um tema do qual pouco se fala e quando se faz, geralmente \u00e9 com enfoque na descri\u00e7\u00e3o biol\u00f3gica dos \u00f3rg\u00e3os sexuais, que j\u00e1 s\u00e3o socialmente reconhecidos. Em algumas ocasi\u00f5es, s\u00e3o as empresas multinacionais de absorventes higi\u00eanicos as encarregadas de prover a informa\u00e7\u00e3o, e neste caso, uma informa\u00e7\u00e3o que representa lucro para eles.<\/p>\r\n\r\n\r\n\r\n Com a chegada da primeira menstrua\u00e7\u00e3o, come\u00e7a o adoecimento no corpo das mulheres, que pode ser fisiol\u00f3gico ou social, ou seja, apreendido. E este \u00faltimo foi alimentado e sustentado entre outras coisas, por mitos, tabus e formas de nomear o sangramento menstrual. \u00c9 ent\u00e3o que se faz necess\u00e1rio mencionar que a forma como se vive esta experi\u00eancia estabelece algumas pautas na rela\u00e7\u00e3o com o corpo e com as viv\u00eancias menstruais futuras.<\/strong><\/p>\r\n\r\n\r\n\r\n Em seu livro Cosas de mujeres [Coisas de mulheres], Eugenia Tarzibachi faz refer\u00eancia a respeito: “A vergonha como estrutura prim\u00e1ria da experi\u00eancia vivida das bio-mulheres encontra uma marca contundente com a primeira menstrua\u00e7\u00e3o, mas se extende muito mais al\u00e9m da menstrua\u00e7\u00e3o, at\u00e9 generalizar-se num sentido de inferioridade do sujeito corp\u00f3reo feminino.” (Tarzibachi, 2017, p. 84). \u00c9 necess\u00e1rio que, quando falemos com mulheres e meninas sobre auto-cuidado, auto-estima, auto-valoriza\u00e7\u00e3o e empoderamento feminino, seja imprescind\u00edvel revisar a rela\u00e7\u00e3o que se tem com o sangramento menstrual e realizar as a\u00e7\u00f5es necess\u00e1rias para desmistificar, ressignificar e acorpar a menstrua\u00e7\u00e3o; esta constitui uma das tarefas imprescind\u00edveis como acompanhantes de meninas.<\/p>\r\n\r\n\r\n\r\n Como resposta ao que foi exposto anteriormente, o projeto liter\u00e1rio e pedag\u00f3gico Princesas Menstruantes tem como objetivo criar espa\u00e7os de di\u00e1logo e reflex\u00e3o que permitam adquirir ferramentas para realizar um acompanhamento consciente. Al\u00e9m disso, o projeto desenvolve materiais pedag\u00f3gicos e liter\u00e1rios que facilitam a que as fam\u00edlias abordem o tema de uma maneira assertiva e pr\u00f3xima das meninas, acompanha o ritual de passagem da menarca e oferece diversas oficinas enfocadas neste tema.<\/p>\r\n\r\n\r\n\r\n