Foram muitas as conversas sobre parto que tive com minhas amigas. Uma delas sempre desejou uma ces\u00e1rea como via de parto. Atualmente est\u00e1 gr\u00e1vida e ainda mais convicta de sua decis\u00e3o. Um amigo em comum me questionou se, sabendo que o parto normal era \u201cmelhor\u201d, eu n\u00e3o tentaria convenc\u00ea-la a mudar de ideia. Mas esse melhor \u00e9 pra quem? Conhecendo intimamente esta amiga, sei que ser submetida a um parto normal seria uma viol\u00eancia para ela. Ela tem sua hist\u00f3ria, seus medos, seus desejos, e todos eles precisam ser respeitados.<\/p>\n

Ent\u00e3o qual \u00e9 o melhor parto? O parto que cada mulher escolhe <\/i>para si.<\/strong><\/p>\n

Vivemos num mundo dos extremos. O Brasil, por um lado, \u00e9 campe\u00e3o mundial de ces\u00e1reas desnecess\u00e1rias. N\u00e3o s\u00e3o raros os casos de beb\u00eas que v\u00e3o para a UTI com problemas respirat\u00f3rios por terem nascido antes do tempo. Existe toda uma cultura de indu\u00e7\u00e3o a ces\u00e1rea que mistura medo e desinforma\u00e7\u00e3o com conveni\u00eancia m\u00e9dica. Exemplo extremo \u00e9 o caso<\/a> que ocorreu em Torres em 2014, quando Adelir, que havia se preparado para o parto normal, foi conduzida por policiais ao hospital e obrigada a fazer uma ces\u00e1rea contra a sua vontade.<\/p>\n

Felizmente, temos assistido a um renascimento do parto normal, com campanhas e dissemina\u00e7\u00e3o de informa\u00e7\u00f5es para que as mulheres entendam a import\u00e2ncia de parir naturalmente, como a Quem Espera, Espera<\/a>\u00a0da UNICEF e os document\u00e1rios O renascimento do parto<\/a> 1 e 2 (ambos no Netflix). Precisamos deixar claro que a ces\u00e1rea \u00e9 uma cirurgia, que aumenta o risco de mortalidade materna e que o parto normal facilita a amamenta\u00e7\u00e3o e a recupera\u00e7\u00e3o da m\u00e3e. O problema dessa mudan\u00e7a de cultura \u00e9 que temos assistido a algumas doses de extremismo, com pessoas defendendo que s\u00f3 o parto normal \u00e9 bom e a m\u00e3e que n\u00e3o o quer ou n\u00e3o o consegue \u00e9 menos forte ou qualquer coisa do g\u00eanero (veja este relato aqui<\/a>). \u00a0<\/span><\/p>\n

Essa discuss\u00e3o n\u00e3o acontece s\u00f3 no Brasil. Em setembro de 2017, Natasha Pearlman, editora da revista Grazia, publicou um relato de parto normal bastante traum\u00e1tico, em que o \u201cparir normalmente\u201d foi levado \u00e0s \u00faltimas consequ\u00eancias, \u00e0 revelia da vontade da m\u00e3e. Ela conta que hoje, mais de 3 anos depois, ainda sofre as consequ\u00eancias, como incontin\u00eancia urin\u00e1ria e o fato de n\u00e3o poder correr. Leia o relato completo aqui<\/a>. O caso dela aconteceu no Reino Unido, pa\u00eds que tem uma cultura muito forte de parteiras, partos domiciliares e onde a maior parte dos partos n\u00e3o s\u00f3 \u00e9 normal (por via vaginal) como natural (sem interven\u00e7\u00f5es como anestesia ou episiotomia). At\u00e9 a duquesa Kate Midletton foi assistida por parteiras e n\u00e3o por m\u00e9dicos durante seus tr\u00eas partos. A quest\u00e3o \u00e9 que o relato de Natasha acabou fortalecendo a ideia de acabar com uma campanha de 12 anos que promove o parto natural no pa\u00eds. Mas ser\u00e1 que precisamos ir para esse outro extremo?<\/p>\n

Diante destes casos – em que uma mulher que queria parto normal foi for\u00e7ada a fazer uma ces\u00e1rea e outra que queria uma ces\u00e1rea foi for\u00e7ada a ter um parto natural – parece estar faltando um elemento na conversa: a escolha da mulher. Cad\u00ea a voz destas gr\u00e1vidas para determinar como elas pretendem colocar seus filhos no mundo? <\/strong><\/p>\n

O trabalho de parto \u00e9 um momento de extrema vulnerabilidade, em que todo o corpo da mulher est\u00e1 trabalhando arduamente para colocar no mundo um outro ser. Ser violentada em um momento como esse, ou seja, ter seu desejo ignorado, pode deixar severas marcas para o resto da vida e inclusive comprometer a maternagem desta m\u00e3e, muitas vezes dilacerada emocionalmente por conta do que passou.\u00a0<\/span><\/p>\n

Mas o que \u00e9 ent\u00e3o um parto humanizado? N\u00e3o \u00e9 um parto na \u00e1gua, com m\u00fasica de fundo ou em casa. \u00c9 um parto em que as expectativas da mulher, obviamente na medida do poss\u00edvel e de acordo com o desenrolar do parto, s\u00e3o respeitadas. Caso seja necess\u00e1rio mudar o curso do que foi planejado, ela precisa ser consultada. Ent\u00e3o uma ces\u00e1rea \u00e9 sim um tipo de parto humanizado para a mulher que o deseja. Mas foi uma viol\u00eancia para Adelir. O parto natural foi o parto humanizado para mim (relato aqui<\/a>), mas foi uma viol\u00eancia para Natasha. N\u00e3o tem regra, depende de cada mulher. Deu pra entender?<\/p>\n

Ent\u00e3o o apelo, hoje, \u00e9 por mais respeito aos desejos das mulheres gr\u00e1vidas. Que suas hist\u00f3rias, inten\u00e7\u00f5es, desejos e medos sejam levados em considera\u00e7\u00e3o e que suas decis\u00f5es sejam postas em pr\u00e1tica durante seus partos.\u00a0<\/span><\/p>\n

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