Confesso que esperava completar 45 diferentemente. Vai ver \u00e9 meu perfil exigente… Acho, tamb\u00e9m, que os \u00faltimos tempos foram uma sequ\u00eancia de perrengues que acabaram me abatendo. Mas eis que, esses dias, veio uma luz que me fez bem e mudou um pouco a forma como eu andava vendo as coisas.<\/p>\n\n\n\n

Pois ent\u00e3o: por muito tempo me vi como uma pessoa sem f\u00e9. Venho de uma fam\u00edlia muito religiosa, mas j\u00e1 n\u00e3o frequento a missa h\u00e1 s\u00e9culos. Na \u00e9poca do Theo, eu ainda acreditava em alguma coisa. Mas o Dan, batizei aos 7 anos como uma formalidade, de carona no batismo das sobrinhas. Quando os meninos me perguntam algo a respeito, respondo: tem gente que pensa assim, tem gente que pensa assado, ningu\u00e9m tem certeza de nada. Cogitava firmemente a possibilidade de isso tudo ser fruto do acaso e n\u00e3o ter prop\u00f3sito algum, embora sempre tenha agido como se esse prop\u00f3sito existisse. Era, e talvez ainda seja, uma salada m\u00edstica ambulante: tenho Cristo no nome e no cora\u00e7\u00e3o, acredito em esp\u00edritos, curto um incenso, sou cheia de supersti\u00e7\u00f5es. Mas a\u00ed minha irm\u00e3, recentemente, me descreveu como a ateia mais crente que h\u00e1, que reza diariamente e chora ao falar de Deus. Isso ficou na minha cabe\u00e7a, porque \u00e9 a mais pura verdade: nego, mas pratico; critico, mas n\u00e3o duvido; acredito, mas n\u00e3o garanto.<\/p>\n\n\n\n

Antes de dormir, me junto aos meninos para a gente agradecer, pedir e cantar. A ora\u00e7\u00e3o de S\u00e3o Francisco \u00e9 a nossa favorita. Tamb\u00e9m me emociono com facilidade quando penso em como a vida \u00e9 divina: das coisas mais grandiosas, tipo o meu Itacolomi, \u00e0s menorzinhas, escondidas no dia a dia. Vejo Deus brilhando nos olhos dos meus filhos, na gentileza inesperada de uma amiga. Em atos her\u00f3icos que vejo na TV, na comida que minha m\u00e3e faz pra mim. Na for\u00e7a dos doentes que superam suas dores, no azul do c\u00e9u em cima da minha rede. No abra\u00e7o do meu pai, no vento que abranda minha rinite, no sorriso de um aluno em dia de formatura. Vejo Deus num medo que venci e em beijos apaixonados. Vejo e sinto a for\u00e7a da vida, mas, recentemente, isso me soou pouco.<\/p>\n\n\n\n

A verdade \u00e9 que os anos passados me mostraram que tudo parece uma sequ\u00eancia de coisas que se encaixam, mesmo que s\u00f3 depois a gente v\u00e1 entender direito como. Ando com a forte sensa\u00e7\u00e3o de que o que \u00e9, \u00e9, pois assim deve ser – pelo menos naquele momento. Tamb\u00e9m parece que tem algu\u00e9m\/algo\/alguma coisa cuidando de mim e de cada um de n\u00f3s. De formas estranhas, consigo ver coisas boas mesmo nas piores e, polianamente falando, se isso n\u00e3o \u00e9 uma esp\u00e9cie de b\u00ean\u00e7\u00e3o, n\u00e3o sei o que \u00e9. Juntando as pe\u00e7as dos meus \u00faltimos tempos, a impress\u00e3o que fica \u00e9 que h\u00e1 porqu\u00eas, ainda que nunca alcancemos todos. Tamb\u00e9m parece claro que, sozinho, talvez a gente n\u00e3o d\u00ea conta. E a\u00ed resolvi me abrir para a ajuda que vem de fora. De longe. De quem ou o que nem sei o que \u00e9 direito. Ent\u00e3o me vi me dedicando ao assunto, de cora\u00e7\u00e3o aberto, pois percebi que pode faltar dinheiro, pode faltar sa\u00fade, pode faltar at\u00e9 amor. Mas n\u00e3o pode faltar a f\u00e9.<\/p>\n\n\n\n

Se antes ela me parecia aliena\u00e7\u00e3o, hoje soa como a mais pura lucidez. Quando minha irm\u00e3 me descreve como uma ateia bem crente, acho que \u00e9 disso que ela est\u00e1 falando: mesmo quando eu questiono Deus, continuo acreditando na vida. Mesmo quando ando pra baixo, a f\u00e9 n\u00e3o me abandona. Porque acredito que h\u00e1, sim, algo maior. Algo de que eu, voc\u00ea, todo mundo faz parte. E penso que estamos aqui, como um pedacinho sagrado disso, pra trilhar um caminho de florescimento. Nem sempre vamos conseguir, mas devemos morrer tentando. Creio firmemente que a gente nasceu pra ser feliz, mas n\u00e3o a felicidade vendida nas redes sociais. Eu falo de uma felicidade constru\u00edda numa vida com sentido. E com tudo que vem no pacote, do melhor ao pior, orgulhosamente posso dizer que essa a\u00ed eu tenho. Nesses 45 anos que passaram, h\u00e1 tanta \u2013 mas taaanta \u2013 coisa que vivi, que n\u00e3o h\u00e1 como ser diferente. Pessoas incr\u00edveis, momentos sensacionais, dores e grandes aprendizados. N\u00e3o fiz nada pra merecer essa chance, mas, se hoje abri os olhos de novo quando acordei, \u00e9 porque ela me foi dada mais uma vez. E eu quero fazer valer a pena. Sei que vou errar de novo, sempre vou. Mas que ao menos sejam erros novos. <\/p>\n\n\n

E, mesmo que eu ainda n\u00e3o tenha alcan\u00e7ado prop\u00f3sitos importantes que tenho pra mim, \u00e9 bom celebrar os passos que dei, os amigos que fiz, a fam\u00edlia que formei, o trabalho a que me dedico, o que j\u00e1 constru\u00ed, aquilo em que cresci.<\/span><\/p>\n\n\n

Os sonhos que ainda tenho e, sobretudo, a esperan\u00e7a que escolhi manter no futuro. Como falar em descren\u00e7a, nesse contexto? Assim, s\u00f3 posso concluir que anivers\u00e1rio \u00e9 dia de f\u00e9 e dia de festa. E, assumidamente, hoje eu quero os dois.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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