Amamentei meu filho por quase 3 anos. N\u00e3o planejei que fosse assim. Apenas foi. Cada dia eu escolhia dar \u201cmam\u00e1\u201d de novo. Uma m\u00e3e pode escolher seguir amamentando depois dos dois anos por raz\u00f5es nutricionais, por querer \u201ccriar com apego\u201d, por acreditar que \u00e9 o melhor para o seu filho. Fato \u00e9, amamentar \u00e9 algo extremamente \u00edntimo e individual,\u00a0 e ter amamentado por mais tempo me deu a oportunidade de me conhecer e me entender melhor.<\/p>\n

No meu caso, eu n\u00e3o queria dizer \u201cn\u00e3o\u201d para o meu filho.\u00a0 Cada vez que ele ca\u00eda, sentia medo ou tinha o brinquedo \u201croubado\u201d no parquinho, l\u00e1 vinha o \u201cmam\u00e1\u201d poderoso. Sempre amamentei livremente e n\u00e3o sei quantos vezes por dia o fazia. Era o seu porto seguro. Com o tempo eu entendi que eu poderia confort\u00e1-lo de outras maneiras mas eu n\u00e3o sabia muito bem o qu\u00ea colocar no lugar. Eu n\u00e3o tinha energia para coloc\u00e1-lo para dormir sem o \u201cmam\u00e1\u201d ou acalm\u00e1-lo nos momentos de desconforto f\u00edsico, durante viagens de avi\u00e3o ou nas madrugadas em que ele acordava. At\u00e9 os dois anos de idade ele acordava muito e coloc\u00e1-lo no peito era o jeito mais r\u00e1pido de faz\u00ea-lo voltar a dormir. Eu estava sempre muito cansada e o peito era sempre a solu\u00e7\u00e3o mais f\u00e1cil para n\u00f3s dois. Al\u00e9m disso, eu nunca tive uma \u201cvila\u201d pra me ajudar a cuidar do meu filho. Ele sempre foi muito ativo e conversador e sempre que eu precisava de um sil\u00eancio, de um descanso no sof\u00e1 no meio do dia pra poder checar as mensagens ou ligar pra algu\u00e9m eu o fazia durante o \u201cmam\u00e1\u201d. Era uma pausa necess\u00e1ria que o ato de amamentar me proporcionava e que, fora dele, era quase imposs\u00edvel.<\/p>\n

Mas a mais \u00edntima das raz\u00f5es eu vim a descobrir com o tempo. Antes do meu filho completar um ano eu me mudei de pa\u00eds. Foi um per\u00edodo muito solit\u00e1rio. Ficava em casa com ele sozinha, todos os dias. O ato de amamentar me dava um trabalho e uma fun\u00e7\u00e3o de indispensabilidade na vida de algu\u00e9m. E era um carinho, um abra\u00e7o. \u00c0s vezes a gente tem isso de outras pessoas. Eu s\u00f3 tinha o meu marido e o meu filho. Aquele era um aconchego necess\u00e1rio. Naquele momento de vida social \u201czero\u201d era o que eu precisava.\u00a0 E acho que meu filho precisou do \u201cmam\u00e1\u201d enquanto EU precisei do \u201cmam\u00e1\u201d.<\/p>\n

Despois de dois anos e meio amamentando eu tive mastite. N\u00e3o sei como foi poss\u00edvel pois nunca havia tido nenhum problema pra amamentar, nem no come\u00e7o\u00a0 (fui dessas sortudas). Mas eu entendi que o meu corpo estava me dizendo alguma coisa. Decidi prestar aten\u00e7\u00e3o nele e finalmente me convenci a planejar o desmame. Decidi limitar a quantidade de mamadas di\u00e1rias. Passei a n\u00e3o dar mais o peito para dormir. Depois de uns 3 meses nesse novo esquema eu combinei com ele que aquela seria a \u00faltima semana. E foi muito tranquilo porque ele j\u00e1 entendia \u201ctudo\u201d. E eu considero essa uma grande vantagem da amamenta\u00e7\u00e3o prolongada. Poder conversar com o seu filho sobre o desmame.<\/p>\n

Em um mundo ideal, a amamenta\u00e7\u00e3o ou a n\u00e3o amamenta\u00e7\u00e3o deveria ser uma escolha. Uma escolha baseada em muita informa\u00e7\u00e3o e com apoio incondicional da fam\u00edlia, amigos e sociedade. Nenhuma mulher deve se sentir obrigada a faz\u00ea-lo mas se assim for seu desejo, que ela tenha todas as condi\u00e7\u00f5es para tal. Cada m\u00e3e tem uma hist\u00f3ria e no fim das contas cabe a ela essa escolha. Da mesma maneira, cabe a ela a escolha de como e por quanto tempo amamentar.<\/p>\n

Infelizmente, a amamenta\u00e7\u00e3o prolongada tamb\u00e9m n\u00e3o \u00e9 exatamente uma decis\u00e3o f\u00e1cil. Apesar de nunca ter sido hostilizada por ningu\u00e9m, eu sempre me flagrava explicando para as pessoas a raz\u00e3o pela qual ainda amamentava e at\u00e9 quando eu o faria. Eu sempre<\/i> precisava dar satisfa\u00e7\u00e3o. Quando voc\u00ea se sente desconfort\u00e1vel em amamentar na rua, no avi\u00e3o, no restaurante, definitivamente n\u00e3o \u00e9 uma coisa da sua cabe\u00e7a. A negativa est\u00e1 no ar, \u00e9 silenciosa e dura. E quanto mais velho for seu filho, mais dif\u00edcil \u00e9 para as pessoas \u201centenderem\u201d. Dizem que ele vai ficar mimado, que est\u00e1 sendo superprotegido, que precisa fazer a transi\u00e7\u00e3o para outro tipo de leite pois o materno n\u00e3o tem mais os nutrientes necess\u00e1rios para uma crian\u00e7a \u201cgrande\u201d. Ah, cada coisa maluca que se ouve!<\/p>\n

At\u00e9 hoje converso com meu filho sobre o \u201cmam\u00e1\u201d. Ele fala que tem saudades. Ele diz \u201clembra quando eu era nen\u00e9m e eu mamava?\u201d. \u00c0s vezes ele d\u00e1 uma espiada no meu peito e \u00e9 a coisa mais engra\u00e7ada do mundo porque eu sei que \u00e9 saudade. A nossa hist\u00f3ria da amamenta\u00e7\u00e3o ainda n\u00e3o acabou porque sempre falamos sobre ela, ele lembra de tudo. E isso \u00e9 muito legal!<\/p>\n

*Este texto foi originalmente publicado em 24 de agosto de 2017.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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