H\u00e1 quase um ano eu tive um burnout. Fiquei 15 dias afastada do trabalho pelo psiquiatra. Nesses 15 dias eu vegetei. N\u00e3o tinha for\u00e7as pra levantar da cama.<\/p>\n\n\n\n

Num mundo pand\u00eamico, com milhares de pessoas morrendo por dia, como as empresas querem exigir produtividade?<\/p>\n\n\n\n

Olhar pro computador era um gatilho. O barulho do whatsapp web me d\u00e1 arrepios at\u00e9 hoje. Peguei trauma do som do Slack, porque sempre vinha uma bomba ou uma cobran\u00e7a de algo que eu n\u00e3o tinha entregado ainda.<\/p>\n\n\n\n

Sou redatora. E nada \u00e9 pior do que a sensa\u00e7\u00e3o de encarar o cursor piscando na tela em branco na sua frente e n\u00e3o saber o que escrever a seguir.<\/p>\n\n\n\n

Eu esque\u00e7o palavras. Pra mim, que sempre tive um vocabul\u00e1rio extenso e falo 4 l\u00ednguas, \u00e9 praticamente inadmiss\u00edvel esquecer um sin\u00f4nimo.<\/p>\n\n\n\n

Lembro do dia em que resolvi marcar consulta com um psiquiatra, incentivada por uma colega de trabalho. Eu tinha tido uma crise de ansiedade numa quarta-feira, passei a noite chorando, me sentindo incompetente por n\u00e3o conseguir produzir 1\/3 do que deveria.<\/p>\n\n\n\n

Na quinta, parecia que um elefante estava sentado em cima de mim. N\u00e3o tinha for\u00e7as pra levantar. Avisei no trabalho que n\u00e3o estava bem e fui acolhida, incentivada a descansar.<\/p>\n\n\n\n

Na sexta, eu tinha um case importante para escrever.  Meus textos eram praticamente impec\u00e1veis. Raramente precisavam mudar alguma coisa. Eu me orgulhava disso. Muito.<\/p>\n\n\n\n

Naquele dia, minha cabe\u00e7a estava embaralhada, as letras na tela do computador estavam espalhadas, confusas. Meu c\u00e9rebro parece que formigava. O esfor\u00e7o para fazer uma frase parecia sobre-humano.<\/p>\n\n\n\n

Eu lia sobre o assunto e n\u00e3o conseguia absorver nada. Eu escrevia e reescrevia as frases porque algo nelas parecia n\u00e3o encaixar.<\/p>\n\n\n\n

Depois minha colega revisou e eu nunca tinha visto um texto meu t\u00e3o cortado. Algo estava errado. Bem errado.<\/p>\n\n\n\n

Desde ent\u00e3o estou em tratamento. Troquei de emprego. N\u00e3o deu certo, durei seis meses e pedi demiss\u00e3o. A cada dia que passava nesse novo lugar eu ficava com medo de uma nova crise daquela.<\/p>\n\n\n\n

Ansiedade tive v\u00e1rias vezes. Ins\u00f4nia tamb\u00e9m. Falta de energia tem sido constante. Como ter g\u00e1s e dar o meu melhor desse jeito? Eu era cobrada por isso. Tinha que dar o meu melhor, “no pain, no gain”, diziam.<\/p>\n\n\n\n

O sentimento de fracasso apareceu de novo. Antes a meta eram 3 mil palavras por dia. Raras vezes consegui atingir. Mas muitas vezes ouvi que tinha que sair da minha zona de conforto. Como, se havia muito tempo eu nem sabia o que era isso?<\/p>\n\n\n\n

\u00c9 dif\u00edcil come\u00e7ar um emprego novo quando voc\u00ea j\u00e1 n\u00e3o tem energia para mais nada. Mas as expectativas s\u00e3o alt\u00edssimas. E as cobran\u00e7as v\u00eam na mesma propor\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Talvez meu erro tenha sido n\u00e3o falar sobre isso antes. Mas quem iria contratar algu\u00e9m que tem problemas psiqui\u00e1tricos que afetam diretamente a produtividade? Sejamos sinceros. Ningu\u00e9m.<\/p>\n\n\n\n

Eu tentei. E demorava horas a fio brigando com os textos. Seja por falta de conhecimento na \u00e1rea dos clientes, por n\u00e3o ver prop\u00f3sito no que estava fazendo ou por falta de criatividade mesmo. E raiva das regrinhas de busca do Google que limitam ainda mais nossa fluidez e criatividade.<\/p>\n\n\n\n

Eu acabava minha meta di\u00e1ria tarde da noite. \u00c0s 20h, \u00e0s 21h, depois \u00e0s 22h e j\u00e1 fui at\u00e9 meia noite algumas vezes. Pausava para comer, tomar um banho e voltava.<\/p>\n\n\n\n

Algumas vezes tinha algum curso, terapia ou aula de dan\u00e7a na parte da noite. Como n\u00e3o tinha acabado a entrega ainda, eu tinha que interromper a tarefa, ir pra esse compromisso e depois continuava o texto.<\/p>\n\n\n\n

Recebia notifica\u00e7\u00f5es no meu celular pessoal de que “Fulana adicionou coment\u00e1rios ao seguinte documento”. Os hor\u00e1rios? 7 da manh\u00e3, 11 da noite.<\/p>\n\n\n\n

Mais algu\u00e9m est\u00e1 passando mais horas trabalhando do que deveria. No m\u00ednimo \u00e9 o que esperam de mim tamb\u00e9m. “Trabalhe enquanto eles dormem”, certo?<\/p>\n\n\n\n

O cansa\u00e7o mental era vis\u00edvel. No dia seguinte estava me arrastando e adivinha? Eu n\u00e3o rendia e come\u00e7ava tudo de novo.<\/p>\n\n\n

\u00c9 dif\u00edcil quebrar esse ciclo. Eu tive que fazer isso antes que meu corpo fizesse de novo e me obrigasse a parar novamente de maneira violenta.<\/strong><\/span><\/p>\n\n\n

Aquelas produ\u00e7\u00f5es que eu levava at\u00e9 tarde, comecei a deixar para o dia seguinte. Obviamente as entregas viraram uma bola de neve. Tive que assumir para mim mesma e para os outros que n\u00e3o estava dando conta. Assumi o que a empresa estava lendo como fracasso, corpo mole, zona de conforto, irresponsabilidade, imaturidade. Eu ouvi e li todos esses adjetivos.<\/p>\n\n\n\n

Aos poucos comecei a dizer n\u00e3o. Uma vez me recusei a produzir um texto cujo t\u00edtulo era “a fal\u00e1cia do conte\u00fado escrito por m\u00e1quinas”, em refer\u00eancia ao uso de Intelig\u00eancia Artificial para produzir mais r\u00e1pido.<\/p>\n\n\n\n

Esse me atingiu em cheio. Eu mesma era cobrada todos os dias pra ser uma m\u00e1quina de textos. Me recusei.<\/p>\n\n\n\n

A ideia do autor era valorizar o trabalho dos redatores humanos. Mas como, se todos os dias eu era tratada como m\u00e1quina? Que n\u00e3o tem sentimentos, que n\u00e3o se preocupa com o que ta acontecendo l\u00e1 fora e que s\u00f3 tem que produzir, produzir, produzir, produzir…<\/p>\n\n\n\n

Comecei a perceber que minha produ\u00e7\u00e3o pr\u00f3pria estava contaminada. Escrever virou um fardo. Eu tinha ideias para text\u00f5es como esse e n\u00e3o conseguia inici\u00e1-los. Logo eu, que sempre tive blog, sempre fiz text\u00f5es no Facebook, Jornalista e que sonhava escrever cr\u00f4nicas.<\/p>\n\n\n\n

O meu modo de sair desse ciclo foi pedindo demiss\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Eu n\u00e3o sei se tudo isso est\u00e1 ligado diretamente ao meu processo psiqui\u00e1trico. Creio que boa parte sim. Outro tanto deve estar ligado \u00e0 falta de prop\u00f3sito e perspectiva que trabalhar com marketing me traz.<\/p>\n\n\n\n

Agora me considero em transi\u00e7\u00e3o de carreira e isso conforta meu cora\u00e7\u00e3o.  De onde tiro energia para isso? N\u00e3o sei.<\/p>\n\n\n\n

A li\u00e7\u00e3o que fica e que quero passar para as mulheres (e para qualquer outra pessoa que passe por um processo parecido) \u00e9: fique atente aos sinais do seu corpo.<\/p>\n\n\n\n

Falta de energia, des\u00e2nimo, sentimento de n\u00e3o querer come\u00e7ar o dia… Tudo isso pode ser sintomas de algo que voc\u00ea n\u00e3o est\u00e1 percebendo. Pode ser at\u00e9 mesmo depress\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

N\u00e3o se deixe explorar se estiver sendo t\u00f3xico. Converse. Nem sempre a empresa \u00e9 compreensiva, mas talvez haja alguma maneira de equilibrar.<\/p>\n\n\n\n

Se voc\u00ea n\u00e3o for acolhida, \u00e9 hora de sair.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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